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A necessidade de regulamentação do teletrabalho

Fernanda Perregil é especialista em Direito do Trabalho e Sócia do Innocenti Advogados, head da área de Direito do Trabalho, Sindical e Remuneração de Executivos.

Existem muitas dúvidas sobre o teletrabalho, mesmo com a previsão dos artigos 75-A ao 75-E, da CLT, introduzidos com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017). O aumento do teletrabalho e a utilização da tecnologia em grande escala trouxeram questionamentos sobre o direito à desconexão digital, ergonomia, etiqueta digital e a segurança da informação.

A prática também demonstrou que as vantagens do teletrabalho envolvem economia nos gastos com infraestrutura e tempo com deslocamento, mas é importante que seja aprovada uma lei específica sobre o teletrabalho no País.

Atualmente existem projetos de lei que buscam regulamentar algumas situações do teletrabalho. O ponto de maior urgência envolve a regulamentação da jornada de trabalho, isso porque segundo o art. 62, III, da CLT os empregados em teletrabalho não estão submetidos ao regime normal de jornada e, por isso, não teriam direito ao recebimento de horas extras. Contudo, no plano fático as novas tecnologias possibilitam ao empregador realizar o controle de jornada do teletrabalhador por meio de softwares, intranet e outros meios tecnológicos.

Em outubro passado um levantamento feito a partir de dados das Varas do Trabalho demonstrou que os processos trabalhistas envolvendo o teletrabalho cresceu 270% no Brasil com a pandemia da Covid-19. Os números de ações subiram de 46 entre março e agosto de 2019 para 170 no mesmo período de 2020.

Os dados acima estão diretamente relacionados ao aumento de trabalhadores colocados em atividades remotas durante a pandemia, de maneira emergencial, sem um período de planejamento adequado. Além disso, o crescimento no número de ações judiciais ocorre exatamente pela falta de regulamentação adequada, o que acaba gerando dúvidas e insegurança no processo de tomada de decisão.

Como amplamente divulgado, na pandemia de Covid-19 e no isolamento social muitas empresas tiveram de implementar em caráter de urgência um plano de trabalho remoto e mudar o regime de trabalho dos seus colaboradores. Por isso, o esperado é que a aprovação de uma legislação específica reduza o número de conflitos dentro destas relações.

Assim, pode-se dizer que há urgência em regulamentar adequadamente o regime de teletrabalho, já que a lei tem por finalidade diminuir os conflitos e regular as relações humanas, considerando ainda o direito como um meio de pacificação social.

Algumas pesquisas apontam que as organizações da América Latina estão atrasadas na digitalização do trabalho[1], isso também reflete na falta de aprovação de leis que amparem o teletrabalho e o trabalho home office.

Em 14 de agosto de 2020 foi publicada na Argentina a Lei n° 27.555/20, regulando de maneira específica o teletrabalho. Desde 2003 a Argentina é signatária da Convenção n° 177/1996 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), quando assumiu o compromisso de aperfeiçoar as condições dos teletrabalhadores, visando inclusive uma política de igualdade entre os trabalhadores.

Essa mesma Convenção nº 177 não foi ratificada pelo Brasil[2], o que apenas reforça a necessidade de nos adaptarmos às necessidades sociais e aos mais variados cenários do teletrabalho.

Dessa forma, é um importante momento de criação de uma lei que inclua as novas perspectivas de trabalho, principalmente com enfoque nas atividades realizadas com recursos tecnológicos, facilitadora de informação e comunicação[3], e que, por consequência, diminua o número de ações judiciais.

O caminho do diálogo e dos acordos entre empregado e empregador sempre terão o seu espaço na solução de conflitos, contudo, a lei tem um papel crucial para constituir direitos e deveres e trazer segurança jurídica para as pessoas.

Assim, que possamos experimentar não só o avanço do teletrabalho, mas também que esse venha acompanhado de uma regulamentação eficaz e moderna, que além de incentivar o teletrabalho consiga atingir o objetivo de fomentar boas práticas, alcançar as atuais mudanças sociais e ampliar as novas formas de trabalho.

NOTAS:

[1] https://jornal.usp.br/podcast/usp-analisa-17-organizacoes-da-america-latina-estao-atrasadas-na-digitalizacao-do-trabalho/ e https://cio.com.br/tendencias/brasil-esta-atrasado-na-transformacao-digital-aponta-estudo/

[2] https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_242947/lang–pt/index.htm

[3] Organização Internacional do Trabalho – OIT “Working anytime, anywhere: The effects on the world of work”.

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