A Tributação do Software pelo STF e sua modulação de efeitos
Em fevereiro, o STF finalmente concluiu o julgamento sobre a tributação de software. Por meio de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade, uma da década de 90, e outra de 2017, definiu a Suprema Corte que o imposto que deve incidir sobre as operações com software é o ISS, e não o ICMS como vinham exigindo alguns Estados, em especial após a publicação do Convênio ICMS nº 181/15 do CONFAZ.
A decisão representa grande vitória aos contribuintes. A cobrança do ICMS pelos Estados ensejava bitributação, uma vez que estas mesmas operações já eram tributadas pelos Municípios, tendo em vista a previsão contida na Lei Complementar 16/2003, de que as operações com software são serviços, tributáveis pelo ISS. O Tribunal entendeu que o software, como propriedade intelectual cuja propriedade não se transfere, não representa circulação de mercadoria e, portanto, não pode ser considerado hipótese de incidência do ICMS.
O Tribunal, no entanto, decidiu pela modulação dos efeitos da decisão, fazendo com que a mesma produzisse efeitos apenas para as operações posteriores ao julgamento. A questão, no entanto, gerou polêmica entre os Ministros, que retomaram o tema em sessão posterior, na qual analisaram todas as possibilidades e determinaram a modulação dos efeitos em 8 hipóteses distintas. Em suma, restou definido que:
- para os contribuintes que recolheram apenas ICMS: não haverá direito à repetição do indébito pelo contribuinte e o Município não poderá cobrar o ISS correspondente;
- para os contribuintes que recolheram apenas ISS: fica vedado aos Estados a cobrança do ICMS;
- para os contribuintes que não recolheram nenhum dos dois impostos: poderão os Municípios cobrar o ISS devido sobre a operação;
- para os contribuintes que recolheram ISS e ICMS e não ingressaram com ação de repetição de indébito até o presente momento: fica permitida a repetição de indébito para o ICMS;
- para as ações judiciais pendentes de julgamento movidas contra os Estados, inclusive repetição de indébito: o julgamento da ação se dará à luz do que decidiu o STF, com possibilidade de levantamento de eventual depósito judicial ou repetição de indébito caso já tenha sido recolhido o ICMS;
- para as ações judiciais movidas pelos Estados para cobrança do ICMS, inclusive Execução Fiscal: o julgamento se dará à luz do que decidiu o STF, estando os contribuintes aptos a levantar eventuais depósitos judiciais;
- para as ações judiciais movidas pelos Municípios para cobrança do ISS, inclusive Execução Fiscal: o julgamento se dará à luz do que decidiu o STF, salvo se o contribuinte já recolheu o ICMS para a mesma operação;
- para as ações judiciais movidas pelos contribuintes contra os Municípios: o julgamento se dará à luz do que decidiu o STF, com possibilidade de conversão em renda de valores eventualmente depositados.
Tal como foi detalhada pelo Ministro Relator, a modulação de efeitos esclareceu pontos bastante relevantes, que poderiam prejudicar demasiadamente os contribuintes caso não houvesse distinção entre os diversos cenários que se instauraram durante os anos em que estes se viram em situação de completa insegurança jurídica frente à disputa de competências. Ainda assim, alguns contribuintes saem prejudicados, ante a impossibilidade de pleitear a devolução do ICMS declarado inconstitucional para aqueles que recolheram apenas o ICMS mas não ingressaram com ação judicial até a data do julgamento do STF. Por outro lado, o Tribunal agiu de forma acertada ao deixar claro que os Estados não poderão exigir ICMS sobre as operações com software, inclusive as realizadas anteriormente ao julgamento.
Vale destacar que o posicionamento do Supremo reforça a necessidade de os contribuintes buscarem o Judiciário com antecedência aos julgamentos da Suprema Corte. O STF impede que aquele que recolheu o ICMS pleiteie a devolução do tributo, ainda que o imposto tenha sido considerado inconstitucional. Por outro lado, permite a devolução do imposto para as ações judiciais movidas pelos contribuintes que estejam em andamento quando do julgamento da ADI.
Por isso, reforçamos o que sempre recomendamos aos contribuintes: que levem ao Judiciário as inconstitucionalidades a que estão submetidos sempre com a maior antecedência possível, seja em razão do prazo prescricional, seja para se resguardarem de eventual modulação de efeitos, cada vez mais presente em nossos Tribunais.
Cinthia Benvenuto Ferreira