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A contratação de prestadores de serviços por empresas de aplicativo aumenta durante a pandemia e entregadores exigem regulamentação específica

Nos últimos anos tivemos várias alterações nas formas de prestação de serviços, com flexibilização para vários setores, motivadas pelas mudanças na Reforma Trabalhista (Lei nº. 13.467 de 2017) e Lei nº 13.874/2019 (Liberdade Econômica), possibilitando novas modalidades de trabalho, o que vem de encontro com o avanço da tecnologia e “desburocratização” das relações de trabalho.

Acompanhando a evolução da tecnologia, os serviços via aplicativo móvel tiveram um aumento considerável nos últimos anos. A vida moderna e a rotina intensa de trabalho de grande parte da população têm colaborado para o aumento desses serviços.

Esse tipo de serviço é uma tendência que deve continuar em ascensão, o que exigirá que as empresas estejam atentas à forma correta de contratação, tanto para se resguardarem, quanto para o fornecimento de boas condições de trabalho, evitando a precarização da mão de obra e a chamada “Servidão Digital”.

Mesmo com essa tendência, houve um aumento significativo dos serviços via aplicativos no primeiro semestre do ano de 2020 por conta da pandemia da covid-19, diante da facilidade de se obter vários serviços pelo celular, garantindo a própria “segurança” e comodidade do consumidor no período de isolamento social.

Por outro lado, tem-se questionado sobre as condições de trabalho destes entregadores, devido as jornadas extensas, ausência de fiscalização que garanta a observância do atendimento às normas de segurança e sanitárias, inclusive o que se tornou mais imprescindíveis durante a pandemia.

O artigo 442-B na CLT, inserido pela Reforma Trabalhista, dispõe sobre a contratação do autônomo nos seguintes termos: “A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação”.

Essa previsão legal estancou a controvérsia sobre as contratações de natureza autônoma, uma vez que a presença do elemento de exclusividade gerava uma presunção de existência da relação de emprego e, assim, a obrigatoriedade do registro em CTPS. Com isso, as empresas passaram a ter maior segurança na contratação de autônomo, no entanto, considerando a existência de uma relação jurídica, o contrato e a relação devem ser assessorados por profissionais especializados, a fim de evitar o surgimento de contingência trabalhista.

Ainda que a natureza do contrato, seja, de fato, de cunho autônomo, as empresas de prestação de serviços via aplicativo, deveriam se atentar as condições mínimas de trabalho, tais como seguro de vida/acidentes, obrigatoriedade de equipamentos de segurança para os prestadores que utilizam motocicletas e bicicletas, treinamentos de direção defensiva, orientações de vestimenta, de boa apresentação do entregador, quantidades de horas sugeridas para a realização das atividades, dentre outros.

Outro cuidado que o cenário atual vem exigindo é a utilização de máscaras de proteção enquanto perdurar a pandemia, higienização constantes das mãos, o que muitas vezes não se verifica nos entregadores, seja pela ausência de orientação da empresa, seja pela ausência de local destinado para tal fim, ou seja, não observância das normas de saúde e segurança.

A falta de uma legislação específica e de fiscalização, mesmo diante da decisão proferida pela juíza da 37ª Vara do Trabalho de São Paulo[1], que julgou improcedente a Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho de SP, por meio da qual se pleiteava o reconhecimento de vínculo empregatício entre os entregadores da plataforma e a empresa iFood, não exime as empresas de serem acionadas na Justiça do Trabalho e os contratos serem declarados nulos, o que poderá ensejar o reconhecimento do vínculo de emprego e o pagamento das verbas trabalhistas, além de danos morais pelo não atendimento às normas de saúde e segurança.

No ano de 2019 o número de acidentes de motocicletas com vítimas registrou um aumento de quase 15%. Outro dado importante, na capital de São Paulo o número de óbitos nestes acidentes bateu o recorde no mesmo período de 2018, segundo o Infosiga[2]. Esses dados servem para demonstrar uma necessidade precípua em fornecer aos prestadores de serviços de aplicativos, equipamentos de segurança e treinamento especializado, principalmente por conta do aspecto de segurança e saúde.

Sobre o precedente acima da 37ª VT/SP, cuja decisão ainda não transitou em julgado, o MPT se pronunciou no sentido de que “a tese defendida no processo está robustamente firmada em relatório de fiscalização e autos de infração lavradas pelo Ministério da Economia, diligências ministeriais, depoimentos e provas produzidas em juízo”.

Ainda não existe um entendimento consolidado no âmbito do Poder Judiciário Trabalhista quanto a questão do vínculo de emprego vs prestação de serviços autônomo dessa categoria. Tanto é que, ao oposto do entendimento da 37ª VT/SP que julgou improcedente a referida Ação Civil Pública, o MM. Juízo da 08ª VT/SP[3], reconheceu a relação empregatícia entre entregadores da Loggi e a empresa, condenando a reclamada na regularização e pagamento dos direitos decorrentes, sem prejuízo da aplicação de multa, inclusive.

Diante do cenário que se instalou entre as empresas e os entregadores de aplicativos, a regulamentação especifica para o setor é de suma importância e já existe uma movimentação nesse sentido. No último dia 08/07[4], representantes dos entregadores de aplicativos, tais como Ifood, Rappi e Uber Eats se reuniram com o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia para apresentar os problemas da categoria e pleitear uma regulamentação que garanta melhores condições de trabalho da categoria. O tema segue sendo acompanhado e certamente terá desdobramentos futuros.

[1] Processo nº. 1000100-78.2019.5.02.0037;

[2] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/04/24/triplica-o-numero-de-mortes-de-ciclistas-no-1o-trimestre-de-2019-em-sao-paulo-diz-infosiga.ghtml e http://www.infosiga.sp.gov.br/Home/Relatorio

[3] Processo nº. 1001058-88.2018.5.02.0008.

[4] https://revistapegn.globo.com/Noticias/noticia/2020/07/entregadores-app-maia.html

Samanta de Lima Soares Moreira Leite Diniz, advogada da área Trabalhista, Sindical e Remuneração de Executivos da Innocenti Advogados Associados.

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