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A doação enquanto instrumento para sucessão patrimonial

A informalidade do instituto e a necessidade de análise das particularidades de cada caso

Por Laura Morganti e Julia Galvão Cavalcante de Queiroz

A discussão sobre a transmissão do patrimônio post mortem é um dos mais delicados temas tratados por familiares. Trata-se de questão inevitável, mas que costuma ser postergada ao máximo pela maioria das famílias brasileiras.

Com a pandemia do Covid-19, entretanto, o interesse da população em enfrentar tal questão tem aumentado[1],  o que tem feito com que a busca pelo planejamento sucessório adequado seja cada vez mais constante.

Dentre os diversos mecanismos possíveis para evitar que a herança seja transmitida apenas pelo inventário (seja este judicial ou extrajudicial), o procedimento mais comum adotado é a doação de bens em vida, normalmente com reserva de usufruto.

De acordo com o Código Civil Brasileiro[2], a doação é um ato unilateral em que uma pessoa transfere bens ou vantagens para outra, por mera liberalidade. Ou seja, o doador transfere seu patrimônio ao donatário sem pleitear nenhum pagamento em troca.

Em que pese se trate de ato jurídico simples, algumas limitações são impostas à doação, a fim de tentar impedir a realização de transações fraudulentas, que possam prejudicar terceiros.

Por tal razão é que o Código Civil de 2002 prevê, em seu artigo 541, textualmente, que “a doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular”. Isto é, em regra, para que o ato jurídico seja válido, antes da transferência do bem, cabe às partes assinar um “contrato de doação”.

Como toda regra traz sua exceção, a legislação brasileira permite que, caso a doação se refira a bens móveis e de pequeno valor, o ato verbal seja considerado válido desde que seguido pela tradição do bem.

Entretanto, a quantificação do “pequeno valor” ainda gera bastante discussão no meio jurídico e foi recentemente abordada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP nº 1.902.405 – SP[3], que, por maioria de votos, reconheceu a validade de doação verbal de R$ 430.000,00, por entender que a quantia transferida, quando comparada ao patrimônio do doador, poderia ser classificada como pequeno valor, atraindo, então, a incidência da exceção legal prevista parágrafo único do art. 541 do CC/02.

Este julgado, quando analisado em conjunto do Enunciado 622 do Conselho da Justiça Federal e após verificado o patrimônio do doador, abre caminho para a possibilidade de desburocratização do procedimento da doação, permitindo que esta se dê sem registro público ou particular, sendo considerada válida apenas com a efetivação da transmissão.

A despeito disso, necessário destacar que a doação é uma das formas mais custosas de se transmitir bens a terceiros, muito por conta da tributação incidente (ITCMD e Imposto de Renda sobre o ganho de capital) e gastos envolvendo a escrituração e registro em cartório (quando se trata de imóveis).

Isto não significa dizer que a doação seja – por seu custo – o meio menos vantajoso para a efetivação da transmissão de bens entre familiares. Mas, sim, que se trata de um instrumento, dentre muitos outros possíveis, cuja adequação ao planejamento sucessório pretendido dependerá de análise detalhada do caso concreto e da composição familiar, sendo essencial, neste caso, a assessoria jurídica de equipe com visão multidisciplinar, capaz de criar um plano sólido e personalizado, a fim de evitar os desgastes decorrentes do próprio procedimento de partilha.

Laura Beatriz de Souza Morgant é sócia da Área Cível e Resolução de Conflitos ([email protected])

Julia Galvão Cavalcante de Queiroz, advogada especialista ([email protected])

 

 

 

[1] Registros de testamentos em cartórios aumentam 134% após a pandemia, por Rafael Gregório, Valor Investe. Disponível em: https://valorinveste.globo.com/objetivo/organize-as-contas/noticia/2020/10/18/registros-de-testamentos-em-cartorios-aumentam-134percent-apos-a-pandemia.ghtml, acesso em 08/09/2021.

[2] Artigo 538 do CC/02: “Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.”

[3] STJ – REsp: 1902405 SP 2020/0069055-5, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 17/08/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/08/2021.

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